“Parece incrível
ainda estar vivo quando já não se acredita em mais nada. Olhar, quando já não
se acredita no que se vê. E não sentir dor nem medo porque atingiram seu
limite.”
Caio F. Abreu
Escrevo. Escrevo até machucar os dedos na esperança de que
as palavras me tragam respostas. Há dias em que odeio com todas as minhas
forças o que me tornei. Quebrei em milhões de pedaços e, além de ter perdido
alguns no meio do caminho, colei errado os que sobraram. Transformei-me em uma
espécie de Frankstein, que deve se manter afastado para não machucar ninguém. Hoje
entendo quando falava que o não sentir pode doer mais que o sentir. Não consigo
entender meus próprios sentimentos, vontades, atitudes. Já passei por vários pensamentos
e hipóteses tão confusas como estou agora. Talvez o pior não tenha sido você
ter me magoado e ido embora, me deixando falando sozinha e sim, ter me ensinado
a ser mais forte. Talvez a dublê tenha assumido todas as cenas do filme. Possivelmente
eu tenha me transformado em outra pessoa, independente, livre, forte, volúvel,
desapegada para que ninguém chegasse nem perto de destruir de novo aquela tola,
frágil, doce, romântica e sonhadora. Talvez o vazio que deixou me preencheu de
tal forma que sem ele eu não saiba mais viver. Pode ser. Ou talvez meu coração
tenha se autocongelado, se recusando a bater dentro de mim, exigindo um novo
dono que saiba o proteger. Quem sabe o erro foi meu de não ter notado antes que
já não havia mais vida aqui dentro. Talvez se me aproximar o máximo possível do
sentimento do trauma eu consiga encontrar os pedaços perdidos. Certamente não
quis aceitar e acreditar que um sentimento tão único, grandioso e bonito tenha
se perdido justamente quando eu poderia senti-lo sem dor e, finalmente, vivê-lo.
Devia ter guardado ele no congelador para que ficasse intacto. Nesse meio tempo,
continuo me sentindo presa, em coma, onde quanto mais luto pra voltar à vida
mais longe dela fico. Mais triste a cada dia. Fria. Talvez, depois de tantas
lágrimas eu, enfim, tenha secado.