"Daqui a 50 anos eu ainda vou saber seu nome e vou me lembrar de todas as vezes que você me fez sorrir. Na minha memória, tão congestionada - e no meu coração - tão cheio de marcas e poços - você ocupa um dos lugares mais bonitos."
Caio Fernando Abreu
Ela caminhava no lugar de sempre e sem pretensão alguma
quando tropeçou naquela pedra de formato singular. Guardou-a no bolso e seguiu
em frente. Cuidava dela com tanto carinho que os outros não entendiam. Intrigou-se
com o seu brilho, lapidou e encontrou a parte mais bonita da pedra. Mas ela se
apaixonou por uma pedra? Não importa, ela estava feliz. A levava com ela
sempre, como um amuleto, mesmo às vezes a machucando por sua dureza. Em um dia
qualquer, com pressa de ser feliz, correu o mais rápido que pôde. Acabou caindo
e machucou muito o peito, onde a pedra estava. Não se importou com isso,
continuou a carregando no mesmo lugar, mesmo piorando o machucado. Resolveu
deixar na mesinha de cabeceira até conseguir levar a pedra no peito novamente.
Pra quem viu de fora não foi nada de mais, mas doeu, doeu tanto que se tornou o
avesso da dor.
Os dias foram modelando sua vida até o dia que se olhou no
espelho e não se reconheceu mais. Olhou para a pedra, que estava linda banhada
pela luz do sol, como quem admira uma obra de arte. Levou-a em uma loja e pediu para que ela
fosse colocada em um colar, pra ficar perto do coração, onde estava acostumada. Não era uma pedra
qualquer, era sua pedra preferida, merecia mais, muito mais do que a garota
podia dar. A pedra só merecia o melhor e a garota seguiu só, vazia, pensando que nunca mais sentiria aquilo tudo novamente. Seguiu, mesmo apática, porque a vida segue. Nasceram para se apaixonar, mas não para ficarem juntas. E assim a
pedra foi para a vitrine, em um belo colar de ouro, esperando fazer parte da
felicidade de alguém.