terça-feira, 27 de novembro de 2012

"Coragem, às vezes, é desapego"

E eis que sinto que em breve nos separaremos. Minha verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia. Agora sei: sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade de solidão. Quem não é perdido não conhece a liberdade e não a ama. Quanto a mim, assumo minha solidão. Que às vezes se extasia diante de fogos de artificio. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio. Guardo seu nome em segredo.
Preciso de segredos para viver.

Clarice Lispector



Talvez pelos diversos tombos, arranhões e cicatrizes que carregamos é que criamos essas barreiras que se tornam parte de nós, por pura proteção, embora sem ter autonomia sobre elas. Todos trazem machucados de um passado distante e, às vezes, nem tão distante assim. Penso que são fases e a duração delas depende muito de cada um. Pulam-se algumas por opção – ou não. Fase de evitar até de conhecer pessoas novas, ou conhecer melhor algumas que poderiam ser algo bom.  Fugir da paquera de ontem porque a vontade de algo mais é inexistente. Fugir da boca que beijou por dias por medo da intensidade das consequências. Já fugi tanto de coisas que poderiam ser tão especiais. Hoje simplesmente cansei de fugir. Dos outros, das coisas, de mim. Hoje estou na fase de conhecer as pessoas e me doar a elas o máximo possível, talvez me apegar e, mesmo rodeada de medos, receios e cicatrizes continuar até onde não tiver mais a trilha feita por nós. Não, não estou querendo uma classificação, nem esperando nada, nem casamento, filhos, contrato assinado em cartório, ou um “para sempre”.
Foi tudo muito rápido, tudo muito nosso, em comum. Tudo muito vago, muito incerto. Ás vezes muito intenso, outras deixado de lado. Muita entrega pra pouca mão. Muito jogo pra algo que não era – e nunca foi – uma competição. Muita vontade pra inúmeras dúvidas. Vários planos pra poucas oportunidades. Muita saudade pra pouco abraço. Muita inconstância pra um constante. Muitas palavras a serem ditas, mas guardadas para alguém que saiba escutar cada uma delas – e queira escutar.
Não sei até que ponto amor e desapego podem andar lado a lado. A vontade (ainda) está inteiramente aqui. O desejo latente. O querer bem. O sorriso no rosto.  Os braços já – e sempre – abertos. Tudo aqui te esperando e você, cadê? Confesso que hoje pensei em, talvez, desistir, tendo a consciência tranquila que não mudará muita coisa pra ti, não te fará mal algum. Desistir de nós. Não porque não te amo, pelo contrário. Os dias que te tenho em meus braços são indescritíveis e os guardarei pra sempre, mas não o suficiente para suprir os dias que não está. E dói tanto cada vez que você não vem.  E, isso sim, rasga cada canto do meu peito. Hoje eu queria um colo pra colher as lágrimas, só para dar uma folga para meu travesseiro. Só dessa vez. Chorar até adormecer em um colo qualquer sem precisar falar uma palavra e poder sonhar. E que esse sonho me explicasse o motivo de tudo o que eu quero se resumir a você. Que ele me traga a sensação de estar bem, completa, mesmo não tendo absolutamente nada. Eu, que nem acreditava mais em Deus, ontem antes de dormir, rezei para que fique bem, que tenha paz no coração e leve sempre um sorriso na alma. Que caso eu não esteja no seu futuro, você tenha forças ou alguém que te cuide e proteja. Que te ajude a levantar quando tropeçar ou que se jogue no chão com você para não se sentir só nesse mar de desapegos. Desejo mesmo que consiga viver a vida com mais profundidade, afinal, na superfície você pode ter mais segurança, ver melhor, mas perde toda a beleza, as surpresas e o colorido que só o fundo do oceano tem. Mas não se preocupe comigo, apesar de tudo, adoro ficar aqui embaixo, mesmo me ralando vez ou outra nas pedras.
Eu apenas lamento. Lamento que de tanto fazer força contra me percebo ficando sem forças, cansada. De tanto fazer força para seguir as “regras” estabelecidas, de tanto cuidar pra não me jogar na piscina vazia, de tanto frear todas as vontades, palavras e sentimentos, fingir que não estou te olhando, não estou me importando, não estou pensando em você ou sentindo sua falta. De tanto fingir “não estar” tenho receio de, em breve, acreditar, ou pior, me acostumar e começar – de fato – a não estar (mais).


*Escrito em 16 de setembro de 2012



Um comentário:

  1. "Mas não se preocupe comigo, apesar de tudo, adoro ficar aqui embaixo, mesmo me ralando vez ou outra nas pedras."
    Aiii, lindoo! Adorei, muito.
    "De tanto fingir “não estar” tenho receio de, em breve, acreditar, ou pior, me acostumar e começar – de fato – a não estar (mais)."
    Me identifiquei?

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