quarta-feira, 23 de maio de 2012

A Aflição do Vazio



    Dor. Não tem outra palavra que melhor se adapte. Como se estivesse rasgando a alma, queimando as células. Ardência em todos os poros. Todas essas sensações se juntando e me dando a impressão de que não vai parar mais. Sinto como se tivesse perdido um pedaço meu, que me impede o respirar – antes inconsciente hoje, sacrificante.
    Não basta você passear em todos os pensamentos que, vez em quando, parece o centro de São Paulo às 18 horas. Viro ansiosa pensando ter ouvido sua voz – não era. Na inércia da agitação sentir o seu perfume trazido por um desconhecido. A loucura me envolveu como um todo. A intensidade da dor é tão agressiva que faria tudo pra parar de me corroer. Tormento que ocupa o vazio que ficou. Você ainda ecoa dentro de cada batimento descompassado.
     Passei por cima de tantas coisas, inclusive de mim mesma. Lembranças me atormentam com uma frequência desumana. A minha cama já não aguenta mais a agitação do sono que não vem. O travesseiro chega a umedecer meus cabelos com minhas próprias lágrimas. Seria a pessoa mais feliz do mundo se alguém me dissesse: “Calma, garota, existe um botão que desliga tudo”.
     Não se pode culpar ninguém, fato. Sequência de falhas, confusões, medos e situações que não favoreceram, certamente. O doer vai mais fundo com o conflito dos desejos. O desespero do que é necessário contra o involuntário. Corro de um canto para o outro e não vejo saída alguma, por mais longe que eu vá. Eu não quero mais sentir! Nada mais me interessa! Só quero que isso pare! Me tirem daqui, por favor... enquanto o que restou de mim ainda consegue pedir socorro!

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Possibilidades Vazias



   Não sei ao certo quem coordena o destino, mas podiam dar uma trégua uma vez ou outra. Momentos que, por mais não sejam o que você realmente espera deles, bastam. Engolir as palavras prontas a ultrapassar os dentes. Fingir que nada acontece. Possibilidades vazias por conta dos acasos e dos “se”s que permeiam sempre a razão. Pensamentos que já chegam com a tarja de censura. Agitados como peixes retirados da água mansa. “Reações químicas” em forma de sentimentos e sensações em constante conflito, oscilando, sussurrando. Uma intensidade quase desesperada que modela do lado de fora um sorriso compreensivo. Conversas sérias, engraçadas, brincadeiras... até virar a esquina, quando finalmente é permitido escorrer o sentimento que não pode ficar do lado de dentro.
 
Tem como andar ao lado e correr em direção contrária ao mesmo tempo?

   Corro! Corro sempre na direção que penso ser a correta. Paro pra tomar fôlego e sinto o vento tocando cada parte do corpo, arrepiando as vontades. Volto a correr na esperança de me livrar, mas quanto mais rápido corro, mais o vento me envolve, me corta, querendo me direcionar para o lado oposto. O lado que definitivamente queria estar. E se eu não posso ir, outros irão. E nada poderei fazer a não ser torcer que seja algo que te faça insuportavelmente bem (sempre), pelo simples fato de você não merecer menos que isso.

    Ainda guardo aquele “vale sorriso” que me faz sorrir por si só, lembrando do seu. Quando voltar à cidade vou cobrar... vários. Sim, vários! Tirei cópias daquele pra quando não aguentar mais não correr o risco de ficar sem minhas doses de você.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Sinceridade em pétalas de amor (verdadeiro)


 
 “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”,
mas assim como a flor, se abandonada ou mal cuidada, morre.
Aí, garoto, só na outra vida – sendo otimista.

    Não abandono ninguém. As pessoas é que me perdem aos poucos e quando se dão conta já é tarde demais. Não, não terá nem o direito de cobrar ou julgar minha decisão. Reflita sobre suas atitudes nos últimos meses antes de criticar as minhas das últimas 3 semanas. Já ouviu falar de ação e reação? É isso que liga seus meses nas minhas semanas. Eu que sempre me humilho finalizando os desentendimentos, dou sinal de vida pra você saber que ainda estou aqui esperando você lembrar disso. Já parou pra pensar que você pode não estar com a razão ao menos uma vez na vida? Cansei. Só. E só estaria, se não tivesse amigos, poucos, mas sempre presentes - pelo que sou, não pelo que posso proporcionar.
“Te amo” virou “bom dia”, dito no auge da alegria momentânea e em situações específicas. Se soubesse o que isso realmente significa teria vergonha de dizer se não o sentisse de verdade. Aliás, vergonha é outra singela característica rara, que me faz acreditar que atuam tão bem, dia após dia, que acabam acreditando em suas próprias mentiras – logo, não tem motivos de se ter vergonha. Seria uma justificativa lógica. E por que estou tentando achar lógica nesses tipos de pessoas? Ah, Sim! Porque tudo é muito óbvio, tudo tem um objetivo, pra não dizer, interesses – que são os recheios de todas as suas atitudes, declarações de afeto, etc. Enfim, aqueles que tentam agradar a todos estão longe de entender que só se conquista as pessoas pelo coração. Qualquer outro agrado é superficial, com data de validade estipulada: até o próximo agradar também, de forma maior ou futilmente diferente.
    Então tomei uma decisão: cuidarei melhor do meu jardim, tirarei - mesmo que isso acabe (mais) comigo - as flores belas só por fora e as que preferem estar no jardim ao lado. Porque só eu sei o gosto das suas ausências, a acidez do seu orgulho e a ardência do seu egoísmo. Vou sim me preocupar com cada pétala das flores que se preocupam comigo e fazê-las tão lindas, fortes e saudáveis que farão inveja a qualquer jardim das futilidades e pó de afetos. Prometi a mim mesma que não vou mais cobrar, pedir ou ficar correndo atrás pra ter as pessoas que gosto por perto. Eu cansei de amizades pela metade, de gostar sozinha. Se tiver interesse de estar ao meu lado, de fazer parte da minha vida, mostre, se faça presente! Se não tem, tudo bem, não ficarei com raiva e continuarei a te tratar com a mesma educação que trato todos os colegas e conhecidos – afinal, você escolhe a categoria que quer pertencer.
    Eu dou o mundo, faço sacrifícios, enfrento quem for preciso por pessoas que são importantes, cujas atitudes me dizem mais que qualquer declaração de companheirismo e amizade. Serão estas que terão minha eterna dedicação, fidelidade, carinho, proteção e o que mais elas quiserem e precisarem. Estou me proibindo de dar prioridade a qualquer um para quem eu seja apenas uma opção.
      Não me leve a mal, mas você, que me procura só quando interessa, faz um favor?
 Não me procure mais!

"Se sou amado,
quanto mais amado
mais correspondo ao amor.

Se sou esquecido,
devo esquecer também,
Pois amor é feito espelho:
tem que ter reflexo."
                         Pablo Neruda

sexta-feira, 23 de março de 2012

Dias Eternos



E vem... Vem de mansinho te tirar novamente a estabilidade – se é que possui alguma. Eu odeio cigarro, mas parece tão bonito quando vejo, em câmera lenta, sua serenidade em meio a fumaça. É uma calma no sorriso que relaxa. Uma firmeza nas palavras que absorve minha atenção totalmente. Viajo nos seus discursos como quem ouve uma bela música tentando decorá-la. Palavras soltas, sem (conseguir) pensar, esbarrando no seu olhar que me atravessa, me tirando o pouco de ar que ainda restava nos pulmões. De longe observo todos os seus gestos, imaginando como seria o movimento dos seus lábios quando beija com intensidade. Como fica seu corpo quando colado em outro contra a parede. Como é... Não! Não vai embora ainda! Você sempre fica tão pouco. Posso não ter tanto a dizer como você, mas sei ouvir como ninguém. Já coloco minha mente a mil procurando uma desculpa para te encontrar novamente. Ansiedade sufocante me acompanhará até lá. Haja unhas inteiras, chocolates e atividades a fazer. Os outros eventos do dia que me perdoem, mas não posso não estar lá.
Chegou o dia, enfim! A sua beleza pode ser vista da esquina. Mas se me dá licença, prefiro ver de pertinho. Não por nada, mas uso óculos, sabe. Verdade! Conversas bobas na cozinha, risadas e um silêncio. Você se estica com dificuldade para pegar os copos do armário que estão logo atrás de mim, o que te traz tão perto que me faz esquecer até o que falava. “Quer que eu pegue os copos?” – indaguei sem piscar os olhos que permaneciam nos seus.
– “Só se a minha proximidade estiver te deixando incomodada.”
– “'Incômodo' definitivamente está longe de ser a palavra certa”.
E foi ali que senti a sua boca intensamente alucinógena, sem nem pensar nas consequências que estavam na sala ao lado. Faria de novo e de novo. E fizemos. Várias vezes no abraço da noite, nos cantos, nas brechas que tínhamos e com o cuidado que era preciso ter. Cuidamos tanto de nós que o que já era grande se tornou ainda maior. Mais abraços, mais carinho, mais desejo, mais amor. Laço inquebrável.
Não precisamos anunciar nosso amor nem temos a necessidade de mostrar nossa felicidade. Vivê-lo em segredo não diminui sua intensidade.
A paz de tudo que pensava e sentia ser confirmado, firmado. Os dias passando entre seus cabelos sem me preocupar com o calendário. Boa noite, meu bem. Dormirei logo, ansiosa, pois amanhã tem mais de você!

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Ponto Final




"As mais perigosas de nossas avaliações são
aquelas que chamamos de ilusões."

 Georges Bernanos

   Gotas, uma a uma, acariciando o vidro da janela onde me encontrava sentada há umas duas horas. A chuva lá fora parece não querer parar. O céu resolveu ser solidário e compartilha suas lágrimas com as minhas. Lágrimas que um dia foram gelo. O gelo forte, denso, capaz de lutar contra tudo, com quem fosse para permanecer ali, refrescando seu ego. Uma faísca aqui, outra ali não foram suficiente para fazer derreter uma só gota. Afinal está congelado, não se vê com nitidez o outro lado, mas está, inteiramente, sempre ao lado. Mas por força maior o gelo vai derretendo e, finalmente consegue-se enxergar o outro lado cada vez melhor. A verdadeira paisagem se revelando só agilizou o processo. As gotas vão escorrendo cada vez mais rápido até não restar mais nada e então, se vê o que realmente tinha do lado de lá. Quem é você? Aquela estória de idealizar alguém que não existe faz todo sentido agora. Não que buscasse a perfeição, mas sim peças que são perfeitas pra mim – para não dizer essenciais.
    Engraçado como aquela música que me fazia viajar a ponto de me deixar sem ar, escutando ela hoje, é apenas uma boa música. Não seria a primeira nem a última vez que um admirado herói, espremendo bem os olhos, se torna o inesperado vilão.
   Não se trata simplesmente de não concordar com atitudes, não aprovar comportamentos, não pensar da mesma forma, muito menos julgar. O ponto é aquilo que sempre vem acima de qualquer outra coisa, sentimento, desejo ou simples diversão. O ponto que cresceu com você, que te faz escolher este caminho ao invés daquele. Que exige a justiça, mesmo que você seja o mais prejudicado. Que, por mais vontade ou sentimento que tenha, não torna o ato real por simples respeito e amizade. Que não pensa, em nenhum momento em prejudicar, mesmo que você ganhe com isso. E é esse ponto que deveria finalizar cada atitude e pensamento. E talvez por isso que o gelo derreteu tão rápido no final. Não tinha um ponto que me ligasse (mais) a você. Eu procurei várias vezes, juro. Isso é bom? Pode-se dizer que foi a chave que me libertou do País das "Maravilhas". E você... bom, creio que é melhor começar a pontuar melhor a sua vida.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

The Game...

"Ou me quer e vem, ou não me quer e não vem. (...)
Prefiro reconhecer com o máximo de tranquilidade possível que
estou só do que ficar à mercê de visitas adiadas e encontros transferidos."

C.F.A.

   O sussurro inesperado que sopra seu nome. O convite que te deixa sem graça. As provocações que te envaidecem.
   A tentação bate a porta. Uma, duas, várias vezes. Até que você - por vulnerabilidade misturada com vontade - aceita a proposta insistente. Mas como assim você foi embora? A bebida ainda permanecia em cima do balcão e o gelo já havia desistido de refrescar a noite. Tudo bem, eu bebo sozinha. Cada gole descia com um ponto de interrogação meio amargo.
  Dias silenciosos caminharam pelo calendário. Como uma nuvem que passa simplesmente por passar, você reaparece. Uma nova proposta é lançada. Com receio é pega no ar só para ver no que ia dar. Desta vez eu te vi. Bastaram dois minutos que virei as costas e, quando retornei, olhei ao redor, já não estava mais lá. Palavras lançadas como flechas certeiras que acompanhavam atitudes aparentemente desinteressadas. Quem tinha que fugir era eu. É um jogo? Claro! Só cuidado para não brincar demais. Eu também sei jogar quando eu quero. O fogo que, olhando rápido, parece brando pode queimar mais do que o incêndio mais violento. Jogue os dados e espere ver qual número vai dar. Ao invés de sair correndo, experimenta cutucar e ficar da próxima vez. Assim eu poderia olhar com calma dentro dos seus olhos e ver a vibração das suas células acompanhando o compasso acelerado do coração.
   Diz que vivo no ninho. Fala com todas as letras que quer, mas não sai da sua zona de conforto. As coisas têm que ser sempre do seu jeito. E caso não sejam, você some numa rapidez e precisão digna de show de ilusionismo. A tímida sou eu, lembra? A timidez que você diz gostar. Pois não parece... vem e fala isso a menos de 5 centímetros do meu rosto, olhando nos meus olhos, pra ver se me convenço. Consegue? Se ainda quiser, estarei aqui, no mesmo lugar. Não hesitarei, prometo. Porém, também não darei nem mais um passo neste tabuleiro.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Frágil


Frágil como toda e qualquer mudança. 
Deve ser feita devagar, doando o que ainda 
é bom e jogando fora o que só ocupa espaço.

 Engraçado como tudo na vida se transforma. Inclusive você mesmo. E acredite, é natural. As mudanças são necessárias e essenciais. São os desconhecidos que se tornam espantosamente presentes, já fazendo parte de você, assim como você deles. O carinho que, sem motivo algum cresce e começa a visitar seus pensamentos dia a dia. A antipatia que ameniza tornando-se indiferente e, quem sabe até, em momentos engraçados. O que era antes não é mais. Hábitos, manias, sentimentos, pensamentos. E a vida vai lhe mostrando portas que, talvez você não tenha a chave, mas vai abrir um dia ou a qualquer momento. Arriscando desde uma simples mudança de caminho na volta pra casa só pra ver o que acontece, mesmo sabendo que a probabilidade de novidades seja mínima. Sim, a vida é muito ampla e rica pra ficar se restringindo de tudo e todos - principalmente de si mesmo. Uma das coisas mais importantes que entendi – e da forma mais dolorosa possível – é que devemos nos esforçar sempre pra fazer bem e arrancar sorrisos de quem a gente realmente ama, enquanto podemos fazê-lo. E, por mais que tenha receio ou esqueça muitas vezes, tento colocar "este lado para cima" sempre que possível. Então realmente não me importo se não vão aceitar ou vão interpretar de um jeito totalmente errado as minhas reais intenções. Eu tenho vontade, eu vou fazer, porque só eu sei o bem que me faz cuidar de quem faz a diferença. As pessoas especiais são poucas, porém, te completam de uma forma quase que abstrata, mas incrivelmente intensa. É difícil – pra não dizer impossível – imaginar a vida sem elas. Não tem como saber quando ele será transferido para outro estado por causa do trabalho, quando ela fatalmente - do dia pra noite - nunca mais sairá com você às compras ou quando ele irá se apaixonar e morar no exterior.
 Exatamente por ser especialmente frágil que se deve cuidar como se fosse de você mesmo. Sem medir esforços, sem esperar nada em troca, sem pensar. Porque a mudança que você está planejando pra começar o mês que vem, meu bem... pode não dar tempo nem de encaixotar.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Hoje sonhei que fazíamos qualquer coisa do dia a dia na mais doce naturalidade como se nada tivesse acontecido. Isso me trouxe a paz que eu precisava pra parar de me culpar.
Pena que era apenas um sonho... mais um...

Ao despertar, a memória - normalmente falha - me lembra que já era tarde, já tinha estragado tudo. Criei um abismo entre nós totalmente desnecessário, por pura confusão. 
Hoje só desejo que tudo volte a ser como antes, assim como no meu sonho. 
 

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Passou do Ponto


Aconteceu uma vez. Não, não faz sentido. Até que... novamente. Coincidência, certamente. Um dia e outro mais pra frente mostravam com insistência. Não! Não tem explicação!
Não consegui mais. Mas fica comigo, é só meu, de mais ninguém. Sem sucesso, reparti, com todos os receios e consequências. Ajudaram a cuidar e, muitas vezes, fortaleciam. Eu não queria, nunca quis. Insistiam pra deixar andar sozinho. Novamente não quis. A dúvida nunca existiu, com exceção em como achar a saída. Com o passar das semanas, meses, deixava escapar algo – algumas vezes por querer. Dia perdido entre os meses que me puxava de volta. E assim que ele passava tudo voltava, junto com o fermento inocente e amigável. E assim ficou em 'banho maria' por um tempo. A confiança foi depositada na panela, com a condição de nunca passar do ponto. Os igredientes selecionados com todo cuidado. O fogo alto falhou uma vez ou duas, mas não notou, pois estava tão certa e concentrada que... acabou transbordando. E nada que fizesse colocaria tudo de volta na panela. Já estava tudo espalhado pela cozinha. Ao olhar em volta não conseguia entender muito bem o que tinha acontecido, mas estava visivelmente orgulhosa pelo prato – mesmo não podendo degustá-lo. Mas minutos depois fitou a mão que estava próxima ao fogão e que nada fez além de assistir. Como um filme, foram passando cenas, conselhos e diálogos que resultaram nessa cozinha imunda. Vergonhosamente, lembrando de todo entusiasmo ao colocar a panela em cima do fogão – enquanto todos se divertiam só esperando o grand finale – o único sentimento ali era pena. E isso, confesso, é um dos piores sentimentos que se pode ter, principalmente quando se trata de si mesmo.
 Na teoria é sempre perfeito, mas na prática é preferível deixar os igredientes mofando dentro do armário a ver eles sendo jogados fora. Como que eu, tão pé no chão, deixei isso acontecer? A única conclusão que consigo chegar é que, além de nunca mais deixar de lado minha intuição na hora de temperar, devo voltar a cozinhar sozinha – sem “ajuda” ou palpites de ninguém. Agora a cozinha precisa dos meus cuidados, com licença.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Grãos de Passado


  Acordei sorrindo, absorvendo a maresia por todos os poros. Tentando ser o mais silenciosa possível pra não te acordar. Fui  até a janela admirar o mar que, nos últimos dias, tem sido o cenário dos momentos mais doces que já tive. Nada grandioso, somente coisas simples que só você sabe dar o tempero necessário tornando-as eternas na memória. Ao voltar ao presente - quase que no susto - me apressei até a cozinha para preparar um capuccino quentinho, sem açúcar, do jeito que gosta. Te despertar acariciando seu rosto e recebendo um sorriso sereno em troca é a sinopse de mais um dia perfeito.
  Lado a lado, de frente para o mar, comentamos sobre as conchas mais bonitas que achamos no caminho. A minha preferida é a que tem forma de coração. A primeira que achei e escondi para te entregar por último.
  Os grãos de areia se misturam com as pintas que mapeiam seu corpo, delimitando o território que tomou conta do meu mapa enquanto estava distraída. O beijo salgado e prolongado quase que em câmera lenta. Descobri o aroma sublime resultante da junção do mar com seus cabelos que deixaria qualquer Chanel Nº 5 pra trás.
  Acordei pra ser feliz mais um pouco. Para a minha surpresa você já tinha se levantado da cama. Te chamo sorridente pelos cômodos, esperando a quaquer momento a surpresa. E a encontrei. O sorriso ansioso se transforma em lábios trêmulos. Um pedaço de papel rabiscado com pressa junto com meu último presente: "Nossas lembranças irão durar uma vida inteira. Guarde as melhores com você, esqueça as outras". Não precisava de nenhuma palavra a mais pra entender que seu passado veio te buscar. Temia que isso viesse a acontecer mais cedo ou mais tarde, mas ignorei essa possibilidade por simples medo. E o que haviamos vivido acabou me distraindo tanto que esqueci que isso poderia acontecer.
  Foi o que guardei então, fora o próprio amor. A música que marcou, o silêncio entre as palavras, o meu silêncio. Farelos de momentos, palavras não ditas, um adeus negado, mágoas. Apanhei pedaço por pedaço do (nosso) passado espalhado pelo chão e tentei transformar num futuro que fosse no mínimo agradável.
  O passado é o mais presente em nosso presente, que inevitavelmente fica de presente. Você pode guardá-lo debaixo do travesseiro ou no fundo do armário, dentro de uma caixa lacrada, a qual não pretende abrir mais.
  Não podia - nem tinha o direito - de impedir você de ir atrás do que faz seu coração acelerar a ponto de perder o ar. Só não queria que levasse o meu junto sabe-se lá pra onde. Quando tiver um tempo - entre uma alegria e outra - devolva ele na caixa de correio. Só caso eu venha precisar dele novamente por conta de um susto ou um pesadelo qualquer. E sem perceber é onde eu estava: em um pesadelo. Aquilo que sempre rondava meus medos resolve acabar com o sonho que estava sendo saboreado com todos os cinco sentidos.
  A onda inesperadamente forte que derruba o castelo de areia, construido pouco a pouco, com as medidas certas e a areia selecionada. A onda fria que te desperta do sono com uma brutalidade quase cruel. Estirada no chão como se tivesse desabado, relembra cada minuto vivido ali. E sobre a areia permanece com olhar fixo, onde as lágrimas e o mar viram um só. Quase coberta totalmente pela água, sem qualquer reação, entendeu que nem tudo que acaba tem  um fim.